Depois do errar
com o Datafolha...
Os leitores
antigos da Folha continuam perplexos. Não entendem o porque de a Folha ter
forçado a barra para passar uma ideia de que o povo prefere que Temer fique no
governo, quando na verdade dois terços preferem novas eleições.
Agora vem um
artigo na página três, onde, mais uma vez a sua própria jornalista de qualidade dá uma
aula sobre o comportamento esquizofrênico dos empresários brasileiros, a tal da
elite, o que inclui a própria Folha.
Enquanto isso, quando vinha
para o Centro hoje cedo, precisei passar pela Avenida Paulista e depois pela Vergueiro. Quando
passei pelo Centro Cultural Vergueiro fiquei impressionado com a beleza de dois
pés de Ipês amarelos, totalmente floridos e brilhando com os raios de sol. Mais
perto tinham outros pés de Ipês rosas, também floridos, mas não tão bonitos
quanto os amarelos.
Fiquei pensando:
O bom artigo de Eleonora na Folha e os Ipês amarelos tão lindos, podiam estar
sinalizando que o Brasil está melhorando. Mesmo com tanto amadorismo e
politicagem nas Olimpíadas. Mas ainda bem que temos gente como Eduardo Suplicy,
simplesmente divino!
Eleonora
escreveu um artigo tão bem feito que resolvi reproduzi-lo abaixo.
Escracho (da elite)
Folha - 26/07/2016
– Eleonora de Lucena
A
elite brasileira está dando um tiro no pé. Embarca na canoa do retrocesso
social, dá as mãos a grupos fossilizados de oligarquias regionais, submete-se a
interesses externos, abandona qualquer esboço de projeto para o país.
Não
é a primeira vez. No século 19, ficou atolada na escravidão, adiando avanços.
No século 20, tentou uma contrarrevolução, em 1932, para deter Getúlio Vargas.
Derrotada, percebeu mais tarde que havia ganho com as políticas nacionais que
impulsionaram a industrialização.
Mesmo
assim, articulou golpes. Embalada pela Guerra Fria, aliou-se a estrangeiros,
parcelas de militares e a uma classe média mergulhada no obscurantismo. Curtiu
o desenvolvimentismo dos militares. Depois, quando o modelo ruiu, entendeu que
democracia e inclusão social geram lucros.
Em
vários momentos, conseguiu vislumbrar as vantagens de atuar num país com
dinamismo e mercado interno vigoroso. Roberto Simonsen foi o expoente de uma
era em que a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) não se
apequenava.
Os
últimos anos de crescimento e ascensão social mostraram ser possível ganhar
quando os pobres entram em cena e o país flerta com o desenvolvimento. Foram
tempos de grande rentabilidade. A política de juros altos, excrescência
mundial, manteve as benesses do rentismo.
Quando,
em 2012, foi feito um ensaio tímido para mexer nisso, houve gritaria. O grupo
dos beneficiários da bolsa juros partiu para o ataque. O Planalto recuou e se
rendeu à lógica do mercado financeiro.
Foi
a senha para os defensores do neoliberalismo, aqui e lá fora, reorganizarem
forças para preparar a reocupação do território. Encontraram a esquerda
dividida, acomodada e na defensiva por causa dos escândalos. Apesar disso, a
direita perdeu de novo no voto.
Conseguiu,
todavia, atrair o centro, catalisando o medo que a recessão espalhou pela
sociedade. Quando a maré virou, pelos erros do governo e pela persistência de
oito anos da crise capitalista, os empresários pularam do barco governista, que
os acolhera com subsídios, incentivos, desonerações. Os que poderiam ficar
foram alvos da sanha curitibana. Acuada, nenhuma voz burguesa defendeu o
governo.
O
impeachment trouxe a galope e sem filtro a velha pauta ultraconservadora e
entreguista, perseguida nos anos FHC e derrotada nas últimas quatro eleições.
Privatizações, cortes profundos em educação e saúde, desmanche de conquistas
trabalhistas, ataque a direitos.
O
objetivo é elevar a extração de mais valia, esmagar os pobres, derrubar
empresas nacionais, extinguir ideias de independência. Em suma, transferir
riqueza da sociedade para poucos, numa regressão fulminante. Previdência,
Petrobras, SUS, tudo é implodido com a conversa de que não há dinheiro. Para os
juros, contudo, sempre há.
Com
instituições esfarrapadas, o Brasil está à beira do abismo. O empresariado
parece não perceber que a destruição do país é prejudicial a ele mesmo. Sem
líderes, deixa-se levar pela miragem da lógica mundial financista e
imediatista, que detesta a democracia.
Amargando
uma derrota histórica, a esquerda precisa se reinventar, superar divisões,
construir um projeto nacional e encontrar liderança à altura do momento.
A
novidade vem da energia das ruas, das ocupações, dos gritos de "Fora,
Temer!". Não vai ser um passeio a retirada de direitos e de perspectiva de
futuro. Milhões saborearam um naco de vida melhor. Nem a "teologia da
prosperidade" talvez segure o rojão. A velha luta de classes está
escrachada nas esquinas.
ELEONORA DE LUCENA, 58, jornalista, é
repórter especial da Folha. Editora-executiva do jornal de 2000 a
2010, escreve livro sobre Carlos Lamarca
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