Ben Bradlee, o homem que derrubou Nixon
Mesmo estando no meio da maior guerra suja que o Brasil já
teve, com estas eleições presidenciais, onde a imprensa brasileira prima pela
mediocridade e a campanha suja contra o PT e a presidente Dilma, vale a pena
parar para ler o noticiário sobre a
morte do maior jornalista americano dos últimos anos.
O Estadão, que também deixou de ser um bom jornal para
assumir a mediocridade eleitoral, publica hoje um artigo muito bom, assinado
por Donald Graham, executivo da Graham Holdings Company e do W. Post, com o
título “Um herói da redação de um grande jornal americano”. Infelizmente não
consegui achar esse artigo na internet e precisei aproveitar este outro bom
artigo publicado no El País, que já foi um ótimo jornal, mas depois que passou
a publicar em português perdeu qualidade.
Faço um apelo para que todos leiam o artigo abaixo.
Nem tudo
está perdido. Ante um mundo com tanta mediocridade e covardia, ainda existem
heróis. É só saber procurá-los. Do caos
renasce a luz. Das experiências das outras pessoas, vamos aprendendo a superar
os desafios pela liberdade e pela universalidade. A Terra é nossa Pátria.
Morre
Ben Bradlee,
editor
que consagrou
o
‘The Washington Post’
Jornalista comandou
o jornal durante o caso que forçou a demissão de Nixon nos EUA
O mundo do jornalismo acaba de se despedir de uma
de suas maiores figuras. Ben Bradlee, ex-diretor do jornal The
Washington Post e
responsável pela investigação do “caso Watergate”,
que acabou forçando a renúncia do presidente Richard
Nixon em 1974, morreu nesta terça-feira em sua casa, na
capital norte-americana, aos 93 anos. Washington fica, assim, órfã de um dos
talentos jornalísticos que marcou a trajetória de um jornal, de uma cidade e de
todo um país.
Desde então, nenhum outro jornalista
norte-americano conseguiu semelhante carta de apresentação: diretor do diário
que descobriu um escândalo de tanta magnitude que acabou provocando a renúncia
de um presidente -- nos Estados Unidos. A única vez que isso ocorreu na
história. Bradlee dirigiu o Post de 1968 a 1991, e a ele também é atribuído o fato
de ter transformado o jornal em um dos três veículos mais lidos e respeitados
do país. O objetivo era inalcançável até aquele momento, apesar de a redação
ficar a poucos quarteirões da Casa Branca, no coração da cidade, a capital do
país mais poderoso do mundo.
Entrar na redação do Post é pisar pelos mesmos corredores em que Bradlee
confabulava com Katharine Graham, então presidenta da empresa dona do jornal,
até provocar a queda de Nixon. É caminhar entre as mesas nas quais os dois
discutiam avanços na investigação com os dois repórteres cujas carreiras também
ficariam ligadas para sempre a esse triunfo do jornalismo sobre o poder e a
corrupção: Bob Woodward e Carl Bernstein.
“A história do Washington Post moderno começa no dia em que Kay Graham nomeou
Bradlee como diretor. Ele era o melhor”, declarou na terça-feira Donald Graham,
que foi presidente do grupo dono do diário até sua venda para Jeff Bezos, há um
ano. “Ele pressionou o quanto pôde para publicar os ‘Papéis do Pentágono’,
liderou a equipe do ‘caso Watergate’. E fez muito mais. Sua ambição para
melhorar o jornal ainda é sentida em cada canto da redação”.
Faz tempo que o Post não repete os êxitos daquela época, mas nenhum
outro veículo conta com as mesmas credenciais. Ninguém mais pode se vangloriar
de ter realizado o sonho de jornalistas do mundo todo, agitando as esferas do
poder, como quando eles tornaram pública a corrupção da campanha eleitoral de
Nixon. O sonho se tornou realidade para Bradlee, transformado para sempre, ao
lado de Nixon, no nome próprio de uma entrevista exclusiva que inspiraria
gerações e gerações de repórteres durante décadas.
Bradlee chegou ápice da profissão depois de ter
trabalhado como jornaleiro em Beverly, sua cidade natal, no Estado de
Massachusetts. No ano passado, foi condecorado com a Medalha Presidencial da
Liberdade, o mais alto mérito civil reconhecido nos Estados Unidos. O
presidente Barack Obama homenageou um veterano da Segunda Guerra Mundial que,
ao voltar para casa, “continuou lutando pelas liberdades”. “Sua paixão pela
exatidão e sua busca incansável pela verdade seguem estabelecendo as bases do
jornalismo”, reconheceu o presidente diante de um dos jornalistas mais
respeitados de sua geração.
De luto, o jornalismo norte-americano é agora um
coro de vozes de admiração e reconhecimento pelo trabalho de Bradlee. Após sua passagem
pela frente de combate no Pacífico durante a Segunda Guerra Mundial, ele se
tornou correspondente da revista Newsweekna
Europa. De volta a Washington, ajudou a família Graham a erguer o Post. A presidenta do grupo, Kay Graham, filha do
primeiro dono do jornal, o nomeou como diretor. O legado de Bradlee vai além do
prêmio Pulitzer ganho pela cobertura do “caso Watergate”: é o de um diretor a
quem se atribui ter contagiado toda a redação com a ambição de contar histórias
e, assim, fazer do jornal uma instituição, um ofício em um pilar da democracia.
Para Woodward, a morte de Bradlee é o fato que
verdadeiramente marca o fim do século XX. “Não há comparação. Ele foi o editor
do século XX”, declarou o jornalista ao site Politico.com. Seu companheiro no
“caso Watergate”, Bernstein, credita a Bradlee a responsabilidade de ter mudado
não só o jornal como também a maneira pela qual se percebe e se define o
jornalismo desde então. “Ele construiu uma instituição”, recorda David Remnick,
estagiário durante os meses em que Bradlee revelou, junto com Woodward e Bernstein,
o escândalo do caso Watergate. “Este jornal não era nada antes da chegada dele.
Não era sequer o melhor jornal de Washington. Tornou-se o segundo maior diário
do país. Deu a ele toda a sua ambição”.
Sempre ao lado de Katharine Graham, Bradlee também
será lembrado pela batalha judicial com o governo norte-americano que
transformaria para sempre as relações entre a imprensa e o poder. O diretor e a
presidenta do Post esbanjaram determinação ao publicar os “Papéis do
Pentágono”, a reportagem exclusiva que revelaria, junto com o The New York Times, a história secreta da Guerra do Vietnã. Apesar
das ameaças da Administração Nixon, os dois jornais defenderam seus argumentos
até o caso chegar à Suprema Corte. A vitória deles reforçou ainda mais os já
poderosos pilares da liberdade de imprensa norte-americana.
Bradlee conseguiu duplicar os números de circulação
do jornal nos 26 anos em que foi seu diretor, e o transformou em um diário com
escritórios em boa parte do mundo, algo ao que não tinha podido aspirar até
então. Sua figura representa também a poderosa influência que o jornal exerceu
quando era seu diretor e coincide com a presença de Kay Graham à frente da
empresa. O Post marcava a atualidade informativa da cidade da mesma
maneira que ditava o ritmo de sua vida social. Graham nunca escondeu suas
conversas com o presidente Lyndon Johnson e Bradlee conservou sua amizade com
John Kennedy.
A família de Bradlee anunciou que sua morte se deu
por causas naturais. Recentemente sua esposa tinha revelado que Bradlee estava
sofrendo de demência, fora internado e não tinha muito tempo de vida. O
diagnóstico tinha acabado de ser confirmado, mas ela descreveu a percepção dos
primeiros sintomas como “a experiência mais terrível” que tinha vivido. Bradlee
se casou três vezes e teve quatro filhos. O primogênito, Ben Bradlee Jr.,
chegou a ser diretor do jornal The
Boston Globe.
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