Caderno 2 - O lado bom do Estadão
Constrangido com o conservadorismo do Estadão
nesta campanha eleitoral de 2014, passei a ler apenas os cadernos de Cultura,
de Economia e de Esportes. O caderno de política envergonha até os antigos Mesquistas.
Beirava ao fascismo, o que a família nunca foi. Mas são outros tempos…
Folheando o Caderno2, o melhor caderno de
cultura jornalística do Brasil, fui surpreendido com uma página dedicada a
Hokusai, o maior pintor japonês.
Uma material primorosa de Andrei Netto. Vejam
que beleza…
Mestre do japonismo
Katsushika Hokusai é objeto
de retrospectiva no Grand Palais de Paris
ANDREI NETTO
- PARIS - O ESTADO DE S. PAULO
30 Outubro 2014 | 03h 00
Artista é um dos maiores pintores da
história
Em 1637, ao publicar Discurso
sobre o Método, o filósofo francês René Descartes pavimentou o caminho do
racionalismo e da modernidade, pregando uma ideia que marcaria a história do
Ocidente: a visão de um homem “mestre e senhor da natureza”.
No Oriente, porém, a noção de
que a grande força é ela, a natureza, e não o homem, ainda imperaria por pelo
menos mais dois séculos. Uma das provas dessa cultura é a obra magistral de
Hokusai (1760-1849), gênio japonês do desenho, da gravura e da pintura, cuja
carreira é objeto de uma retrospectiva em cartaz no Grand Palais, em
Paris.
Nascido em Edo, atual Tóquio, em
1760, Katsushika Hokusai, “o louco pela pintura”, foi um desenhista, pintor e
artista popular. Filho de pais desconhecidos, depois adotado aos quatro anos de
idade, começou a estudar xilogravura na adolescência, entre 1773 e 1774, e no
ano seguinte publicou suas primeiras ilustrações, um total de seis páginas em
um romance cômico.
Em 1778, passou a membro do
ateliê do mestre das estampas e Katsukawa Shunsho, quando desenvolveu a arte
dos retratos e evoluiu como artesão desenhista, mas sem que seu valor artístico
fosse reconhecido.
A partir de 1794, após adotar o
nome de Sori - um dos inúmeros que usaria ao longo da carreira -, a obra de
Hokusai ganhou em complexidade e em riqueza. Seu trabalho passou a integrar
publicações mais refinadas, o que o fez mais conhecido.
Seu destaque então cresceu entre
1805 e 1810, quando sua obra tornou-se referência em livros de leitura, os
yomihon, pelo talento expresso no traço firme, mas delicado, e pela técnica
precisa no manuseio do nankin. Então ficou mais clara a beleza de suas
ilustrações, que consolidavam um estilo marcante: arte refinada sobre temas
ordinários, como a vida cotidiana, a mulher e as tradições do Japão, não raro
com humor.
O período seguinte, iniciado em
1814, quando adotou o nome de Hokusai manga, marcou sua consolidação como
artista admirado e seguido por discípulos, que o elevaram ao status de mestre.
É dessa época uma de suas obras mais impressionantes, os Hokusai manga, um
conjunto de 15 livros e 3,9 mil desenhos que são em si uma antologia de sua
produção artística no período.
Seu talento e sua capacidade de
se reciclar como artista e explorar novas fronteiras técnicas ainda o levariam
a produzir a sequência mais célebre de seu trabalho. Aprofundando-se nas
ukiyo-e, as “estampas do mundo flutuante”, Hokusai desenvolveu suas Trinta e
seis vistas do monte Fuji, obras inconfundíveis pelo tema e pela complexidade
técnica, que contrasta com sua beleza simples, ressaltada pela força das cores,
do vermelho profundo ao azul marinho.
A julgar pela aglomeração de
visitantes no Grand Palais, observar sua obra-prima, A Grande Onda de Kanagawa,
desperta fascínio, talvez pela oportunidade de admirar o que Valter Benjamin
chamou de “aura” de uma peça original, inexistente em suas reproduções. Ali
está toda a potência de uma obra que mostra o apogeu de um gênio, com a mesma
firmeza e delicadeza do traço de seus primeiros trabalhos, somadas a uma
sensibilidade primorosa na escolha das cores, nos dégradés de azul do mar
violento ou no céu neutro que completa a paisagem.
É nessa sala, dedicada ao
período Litsu, entre 1820 e 1834, que talvez esteja a chave para compreender a
riqueza da obra de Hokusai. Muito além da beleza de seus traços e de suas
formas e cores, há uma mensagem poderosa: a de que a natureza é a força
irresistível, a potência avassaladora e incomparável ao poder do homem - um coadjuvante,
e não seu “mestre e senhor”.
Hokusai é, ao lado de Hiroshige
e Utamaro, o expoente do “Japonismo”, como o colecionador Philippe Burty
denominou em 1872 a onda de influência exercida pela arte japonesa sobre
pintores, escultores e escritores da França e, a seguir, de todo o Ocidente.
Inaugurada por Félix Bracquemond, primeiro artista europeu a reivindicar a
influência, em 1856, quando reproduziu sobre porcelana figuras animais
presentes nos Hokusai manga, a tendência se alastrou pelo meio artístico
europeu.
Nomes como Van Gogh, Gauguin,
Monet, Manet, Degas, Renoir, Pissarro, na pintura, Rodin, na escultura e no
desenho, ou ainda Baudelaire, Mallarmé, Victor Hugo, Proust, Goncourt e Zola
foram influenciados, seja por técnicas e estilos, seja pela sensibilidade e
pela estética nova, pela busca da perfeição e do sublime na arte.
Eu não leio NENHUM jornal há muito tempo. Também não vejo TV - só futebol. Me informo pela internet. Pro dia-a-dia, pelo rádio.
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